A manhã de domingo (10) em Realengo, Zona Oeste do Rio, foi marcada por uma tragédia que deixou a comunidade em choque e colocou novamente em pauta a discussão sobre os limites da negligência parental. Vanuza Moura, de 23 anos, foi presa em flagrante após deixar seus dois filhos – um menino de 5 anos e uma bebê de apenas 8 meses – sozinhos em casa para ir a um baile funk. Quando retornou, cerca de seis horas depois, encontrou a filha sem vida. A principal linha de investigação aponta que a criança pode ter se engasgado com a mamadeira preparada pela própria mãe antes de sair. O caso foi registrado como abandono de incapaz seguido de morte, crime com pena que pode chegar a 12 anos de prisão.
De acordo com a Polícia Civil, Vanuza deixou instruções para que o filho mais velho alimentasse a bebê caso ela chorasse durante a noite. A mãe teria saído de casa já de madrugada, trancando as crianças sozinhas. Testemunhas afirmam que a jovem retornou apenas por volta das 8h30 da manhã. Foi nesse momento que encontrou a filha desacordada e, em desespero, correu até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Magalhães Bastos. Os médicos confirmaram que a bebê já havia chegado sem vida, e o caso mobilizou imediatamente a Polícia Militar e a 34ª DP (Bangu), responsável pelas investigações.
A prisão ocorreu ainda na unidade de saúde, enquanto agentes se dirigiam até a residência da jovem. O cenário encontrado foi descrito como “totalmente insalubre”: paredes sujas, roupas espalhadas pelo chão e ausência de qualquer estrutura mínima para o cuidado das crianças. A avaliação policial aponta que o ambiente, além de inseguro, favorecia situações de risco grave, como acidentes domésticos e exposição à contaminação. As imagens e relatos reforçaram a gravidade do crime, ampliando a indignação social diante da morte de um bebê de apenas 8 meses.
Durante as diligências, vizinhos relataram que a negligência não era inédita. Segundo moradores, era comum que Vanuza deixasse os filhos sozinhos por longos períodos, inclusive durante a madrugada. Embora seja mãe de cinco crianças, apenas duas viviam com ela; as outras três estariam sob cuidados de familiares. A reincidência desse comportamento levanta questionamentos sobre a ausência de denúncias formais anteriores, que poderiam ter evitado a tragédia. A Polícia Civil apura se houve omissão da comunidade e se o Conselho Tutelar já havia recebido notificações anteriores sobre o histórico de abandono.
O Conselho Tutelar foi acionado assim que a ocorrência foi registrada e assumiu a guarda provisória do menino de 5 anos. Segundo relato dos agentes, a criança estava emocionalmente abalada, mas em condições físicas estáveis. Ele passará por acompanhamento psicológico, já que além de perder a irmã de forma traumática, foi colocado em uma posição de responsabilidade incompatível com sua idade. Especialistas alertam que, em casos como este, os impactos emocionais podem ser devastadores e exigir anos de acompanhamento para amenizar marcas deixadas pela negligência.
A morte da bebê em Realengo reacendeu o debate sobre a importância de redes de proteção à infância. Dados do Disque 100, serviço de denúncias de violações de direitos humanos, indicam que o abandono de incapaz figura entre os casos mais recorrentes envolvendo crianças no Brasil. Delegados e conselheiros tutelares reforçam que vizinhos, familiares e até comerciantes de bairros precisam estar atentos a sinais de risco. “O silêncio, nesses casos, também mata”, afirmou um delegado da 34ª DP. A afirmação reforça a necessidade de mobilização coletiva para que situações de vulnerabilidade não sejam ignoradas até que se tornem irreversíveis.
Enquanto aguarda audiência de custódia, Vanuza Moura segue presa e responderá pelo crime de abandono de incapaz seguido de morte. O corpo da bebê foi encaminhado ao Instituto Médico-Legal (IML), onde passará por exame para determinar a causa exata do óbito. Na comunidade, a dor da perda se mistura à indignação diante da negligência materna e da ausência de proteção institucional mais efetiva. Para muitos, a tragédia em Realengo não é apenas uma história de descuido individual, mas um reflexo de falhas sociais e da urgência em criar mecanismos que realmente protejam crianças em situações de risco.