O silêncio que pairou sobre a Estrada Transacreana, em Rio Branco, no último domingo (21), ainda ecoa como alerta para centenas de famílias acreanas. Uma tragédia envolvendo duas crianças, que perderam a vida em um acidente de motocicleta, voltou a colocar em evidência um problema recorrente e perigoso: o transporte de menores em veículos de duas rodas sem a devida proteção. O caso não apenas comoveu a população, mas também reacendeu um debate urgente sobre a segurança viária e os limites da imprudência cotidiana.
O acidente ocorreu quando o pneu da motocicleta em que a família viajava estourou, levando o condutor a perder o controle e colidir violentamente contra um poste de energia elétrica. No veículo estavam quatro pessoas: o padrasto das crianças, Juciclei da Silva do Carmo, de 25 anos; a mãe, Melry Wanda da Silva Carneiro, de 23; e os pequenos Valentina Rebeca, de apenas 3 anos, e Arthur Miguel, de 5. As consequências foram devastadoras. As crianças, que não usavam capacete no momento do impacto, tiveram ferimentos fatais e morreram ainda no local, antes da chegada da equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
A ausência do item de segurança foi determinante para o desfecho da ocorrência, segundo destacaram os primeiros socorristas. Enquanto os pais foram resgatados em estado grave e permanecem internados no Pronto-Socorro de Rio Branco, Valentina e Arthur se tornaram símbolos de uma estatística que insiste em crescer. O Brasil ocupa posições preocupantes nos índices de mortalidade infantil no trânsito, e a cena registrada na capital acreana reforça, mais uma vez, a fragilidade das crianças quando submetidas a condições inadequadas de transporte.
De acordo com a legislação brasileira, crianças menores de 7 anos não podem ser transportadas em motocicletas. Entre 7 e 10 anos, a prática só é permitida se o menor alcançar os pedais de apoio com os pés e utilizar capacete apropriado ao tamanho da cabeça. Apesar das regras, a realidade observada em diversas cidades do país mostra o contrário: motocicletas carregam famílias inteiras, muitas vezes sem equipamentos de segurança, em estradas sem fiscalização constante. Para especialistas em trânsito, a normalização dessa prática cria um ambiente em que o risco é encarado como parte da rotina, até que a tragédia se impõe.
O caso mobilizou equipes do Batalhão de Policiamento de Trânsito (BPTran) e da perícia técnica, que isolaram a área para apuração das causas. Os corpos das crianças foram levados ao Instituto Médico Legal (IML), enquanto a Delegacia de Flagrantes (Defla) assumiu as investigações. Embora as circunstâncias indiquem falha mecânica — o estouro do pneu —, a falta de equipamentos de proteção foi decisiva para a gravidade do acidente. Autoridades locais reforçaram que campanhas educativas estão em andamento, mas reconheceram que a adesão da população ainda é baixa.
Especialistas em segurança viária destacam que o uso do capacete pode reduzir em até 70% o risco de traumatismo craniano em acidentes de motocicleta. Para crianças, a proteção é ainda mais crucial, já que a anatomia delicada as torna mais vulneráveis a impactos. “Não se trata apenas de cumprir a lei, mas de preservar vidas. Crianças não têm estrutura física para suportar choques tão violentos”, afirma um instrutor de trânsito ouvido pela reportagem. Segundo ele, além do uso de capacetes adequados, os pais devem avaliar se o veículo é realmente a forma mais segura de transporte para seus filhos.
A dor da família de Valentina e Arthur agora se mistura ao alerta coletivo. Amigos e parentes organizam redes de apoio e mobilizações solidárias para ajudar no tratamento dos pais, enquanto a comunidade discute formas de evitar que outras famílias passem pelo mesmo sofrimento. Para além das estatísticas, a tragédia deixa um recado claro: a pressa do dia a dia não pode custar a vida de inocentes. Transportar crianças em motocicletas exige responsabilidade redobrada, respeito às normas de trânsito e, acima de tudo, a consciência de que a prevenção é a única forma eficaz de evitar desfechos tão dolorosos.