A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para enfrentar uma das etapas mais delicadas da investigação sobre a tentativa de golpe de Estado atribuída ao ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados. Entre os alvos da Procuradoria-Geral da República (PGR), estão o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o influenciador Paulo Figueiredo, acusados de articular manobras para pressionar o Judiciário e interferir diretamente no julgamento do ex-presidente. A expectativa é que os ministros aceitem a denúncia e transformem Eduardo em réu, mas obstáculos processuais e o acúmulo de casos semelhantes devem adiar essa decisão para além de 2025.
Segundo a PGR, Eduardo teria buscado apoio no governo do republicano Donald Trump, nos Estados Unidos, para tentar suspender sanções e tarifas contra o Brasil. A iniciativa, de acordo com a acusação, tinha como objetivo retaliar autoridades brasileiras do Judiciário, em especial ministros do STF, responsáveis pela análise do papel de Bolsonaro na tentativa de ruptura institucional. Esse movimento, classificado como grave por procuradores, se insere em um contexto mais amplo de tentativas de minar a confiança nas instituições democráticas e ampliar a pressão internacional sobre o Brasil.
O processo, no entanto, não deve avançar no ritmo inicialmente esperado pelos ministros da Corte. Fontes próximas ao tribunal indicam que a prioridade será concluir o julgamento dos quatro outros núcleos da chamada “trama golpista”, cujas investigações já estão em andamento. Somente após essa etapa será possível analisar de forma aprofundada a denúncia contra Eduardo Bolsonaro. A fila de processos, aliada à complexidade do caso, torna praticamente inviável qualquer decisão definitiva ainda em 2025, contrariando a intenção inicial de dar celeridade às apurações.
Outro elemento que pode atrasar o julgamento é o fato de a denúncia envolver também Paulo Figueiredo, influenciador digital e neto do ex-presidente João Figueiredo. Diferentemente de Eduardo, Figueiredo não tem domicílio no Brasil, o que gera dificuldades adicionais para sua citação formal. Na última terça-feira (23), o ministro Alexandre de Moraes concedeu prazo de 15 dias para que ambos apresentassem defesa. No entanto, a ausência de endereço fixo do influenciador em território nacional abre uma série de desafios jurídicos para a tramitação do processo.
Juristas consultados pelo blog apontam, contudo, que a situação de Figueiredo não impede que ele responda pelas acusações. “Ele é brasileiro, nacional do Brasil, e supostamente cometeu um crime que teve efeitos diretos sobre o país. Portanto, está sujeito à lei penal brasileira”, afirmou o professor Gustavo Sampaio. Os especialistas explicam que existem diferentes caminhos para a notificação, incluindo a utilização de endereços de familiares, a expedição de carta rogatória ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos ou, em último caso, a citação por edital em veículos de imprensa brasileiros acessíveis no exterior.
O professor Thiago Bottino detalha que a cooperação jurídica internacional costuma ser o instrumento mais eficiente nesses casos. “O Ministério da Justiça, por meio do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, encaminha a solicitação diretamente às autoridades americanas. Assim, a notificação realizada no exterior tem plena validade no Brasil”, explica. Já Eloísa Machado, também ouvida pela reportagem, lembra que, em hipóteses excepcionais, a citação por edital é considerada válida, ainda que represente um recurso extremo diante da ausência do réu em território nacional.
Enquanto a defesa dos acusados prepara sua estratégia, o ambiente político se mantém em alerta. A eventual transformação de Eduardo Bolsonaro em réu representa um novo capítulo da crise institucional que se arrasta desde a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, ampliando as tensões entre o bolsonarismo e o STF. O caso, que envolve também articulações internacionais, é visto como emblemático para medir até que ponto a Justiça brasileira conseguirá impor limites às tentativas de corrosão do Estado democrático de direito. Resta saber se a Corte conseguirá avançar sobre esses impasses processuais sem perder de vista a necessidade de respostas rápidas a um dos episódios mais graves da história recente do país.